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CINEMA, VÍDEOLOCADORAS E URUBUS

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O filme do fim de semana ou o dia romântico chuvoso regado a filmes tem se tornado cada dia mais difícil. A crise econômica é um fator sério e as pessoas têm cortado as coisas que elas dizem ser mais supérfluas como o lazer ou o entretenimento. Obviamente também como um dos fatores iniciais para a crise das vídeolocadoras, a pirataria se mantém e cresce com mais força a cada dia, o que já ocasionou o fechamento de muitas empresas. De acordo com a União Brasileira de Vídeo – UBV com dados revelados à Folha Online, existem 8 mil locadoras no país, 4 mil a menos que três anos atrás.
Alguns proprietários acreditam que os fatores citados acima não são os principais e sim a diversidade da indústria do entretenimento como bares, shows, restaurantes e eventos, as pessoas não tem mais tempo para ficar em casa, se no dia a dia correm com o trabalho, nos fins de semanas aproveitam a diversão.
Independente dos fatores, a realidade é que os estabelecimentos, sejam vídeolocadoras pequenas, médias ou de grande porte tem buscado alternativas para sobreviver aos problemas que vem enfrentando. A Cristal Video encontrou nos filmes clássicos e raros uma forma de atrair clientes. A pirataria nesse caso não tem muita influência sendo que as produções antigas não costumam tanto ser o alvo das reproduções. A Dumont, vídeolocadora tradicional de Belo Horizonte sofreu transformações atualmente agregando vários tipos de negócios e conta agora com uma loja de conveniência e um espaço para uma operadora de celular. Para facilitar ainda mais a vida do cliente, a Dumont possui atendimento online e entrega os filmes escolhidos na casa do consumidor. Esse processo ocorreu também com a Blockbuster que foi vendida às Lojas Americanas e criou a Americanas Express tendo a locação de filmes apenas como um item a mais.
Outro fator preocupante das empresas do segmento são as transições de mídias. Desde a transformação da fita VHS para o DVD, as vídeolocadoras começaram a se adaptar e acompanhar o processo tecnológico. Agora com a invenção do Blue-ray, os DVDs estão com os dias contados. Essa nova mídia é mais cara, mas até por enquanto não conseguiu ser alvo da pirataria e possui ponto positivo em armazenamento de dados, e o principal, qualidade de imagem e som, são fatores que vai deixar o cliente mais satisfeito, se o Blue-ray popularizar e der certo é possível ver luz no fim do túnel, se não as vídeolocadoras começarão a fechar suas portas.
Com tantos problemas as empresas vem tentando manter e fidelizar os clientes através de promoções e campanhas contra a pirataria, alguns proprietários também acreditam que as vídeolocadoras poderão de alguma forma se beneficiar também com os downloads de internet.
As empresas acreditam ainda que só continuam abertas por causa dos cinéfilos, esse grupo que tem verdadeira paixão pelo cinema ainda buscam os filmes de diversos tipos, do filme B ao de Hollywood, e é um grupo que as empresas se preocupam em manter. Algumas já viraram um “point cultural”, onde há livros, revistas e filmes, onde os amantes do cinema poderão trocar idéias e experiências, mas a crise ainda tem desacelerado um pouco essa proposta.
O futuro desse segmento é incerto, os problemas existem e lutar contra isso é um pouco difícil, é uma indústria lutando contra diversas indústrias e todas pelo mesmo público-alvo. Algumas são obrigadas agir de forma correta, outras se aproveitam da possibilidade, mas no fim todos perdem. Infelizmente isso contribui para a banalização da cultura, afinal apreciar a arte tem tido seu preço e a expressão disso tudo tem virado um filme onde o personagem principal é o dinheiro.

CRIAÇÃO DA IMAGEM

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No ano de 2008, na edição número 4 da Revista Reserva Cultural Ano 1 da Editora Lazuli, a diretora de arte Guta Carvalho, onde trabalhou em filmes como “Nina” e o ótimo “O Cheiro do Ralo”, contou como sua função no set de filmagens faz a diferença – mesmo que poucos percebam.
Como sempre ao assistir um filme foco muito no poder imagético e escrevi muito sobre ele nas colunas anteriores, a entrevista de Guta Carvalho na Revista Reserva Cultural retrata um pouco sobre a importância da direção de arte e imagem, alicerce da narrativa cinematográfica.
Reserva Cultural – Como é seu processo criativo?
Guta Carvalho – É longo, geralmente demoro meses. Depois de ler roteiro, fico pelo menos uns dois meses procurando imagens que possam traduzir o que o roteiro está falando. Por exemplo, assisto a vários filmes pensando nesse roteiro, leio livros, procuro um conceito em pinturas clássicas e modernas. Além disso, tenho um caderno onde guardo as coisas que vêm à minha cabeça a respeito do projeto. Às vezes lendo uma revista, vejo uma imagem que acho a cara do filme. Aí guardo essa imagem no caderno.
RC – Mas também muita coisa que já vem especificada no roteiro...
GC – Tem, mas tudo isso pode mudar. Na verdade, muda muito. Essa coisa de imagem no roteiro é quase só para não ficar tão simples. Quase nunca a concepção visual está no reoteiro.
RC – Como foi seu trabalho de pesquisa em “À Deriva”, que é um filme que se passa nos anos 80?
GC – Além do conceito visual que eu e o diretor achávamos que o filme tinha de ter, tive uma grande pesquisa de época, baseada em muitas fotos do meu arquivo pessoal. Também assisti a filmes feitos no período e a outros que retratam essa época. Acho que qualquer filme que saia da atualidade se torna mais difícil de fazer. Por exemplo, você não pode errar na roupa... porque direção de arte também é figurino. Apesar de que a concepção talvez não seja mais difícil do que a de um filme passado nos dias de hoje. Em um filme que retrata um tempo passado, você está copiando uma época.
RC – Qual o conceito visual que você buscou em “Nina” e em “O Cheiro do Ralo?
GC – Demorou três anos só para captar o dinheiro para fazer “Nina”, e o diretor já tinha me chamado para o projeto. Durante todo esse tempo, a gente conversava o tempo todo sobre o filme, baseado no livro “Crime e Castigo”, de Dostoievski. Então, o projeto imagético do filme é expressionista, feito totalmente como se estivesse dentro da cabeça da personagem. A direção de arte já foi pensada para não ter cor em quase nenhum elemento. É até exagerado, mas é porque é expressionista. Já “O Cheiro do Ralo” foi pensado numa paleta de marrons e beges, era o que a gente achava que a história contava. Esse cara vivia um ciclo estranho e era obsessivo, achei que um tom de bege traduziria o sentimento dele. E como é um cara solitário, anda por ruas desertas, a sala onde trabalha é grande, tudo isso ajuda a mostrar a dureza de sua vida. Ele sempre está caminhando por lugares que têm muros, e você vê pequenininho ali. Assim, a história é traduzida em imagem.

Reserva Cultural – Na sua opinião, por que a arte de “O Cheiro do Ralo” foi tão elogiada pelo público e pela crítica?
Guta Carvalho – Teve bastante crítica ruim também [risos] . Gosto de “Nina” tanto quanto, mas como não foi tão bem sucedido, por vários motivos, a direção de arte também não foi falada. Todo mundo gosta de “O Cheiro do Ralo”, aí gostam de tudo no filme: trilha sonora, direção de arte etc. Como vem de uma história em quadrinhos, do Lourenço Mutarelli, tem um pouco desse lado cômico na direção de arte também. Acho que as pessoas se identificam com isso. Poderia ser uma coisa, mas não é. Traz quase uma alegria ver aqueles objetos curiosos, as pessoas reparam porque é diferente. Essa direção de arte não é tão óbvia, tem uma sala enorme onde tem até um fliperama. Isso não estava no roteiro, mas traz um humor que as pessoas gostam de ver.
RC – Você considera que, especialmente no Brasil, o projeto de arte é pouco discutido e problematizado?
GC – Acho que realmente se fala pouco e não se discute... a questão estética ainda é uma coisa muito nova no Brasil. É um problema muito sério, as pessoas acham que é menos importante mesmo. Agora está melhorando bastante. Mas, no Brasil, a tendência é retratar muito a realidade como ela é, não há uma busca por imagens novas.
RC – Como se dá a formação de um diretor de arte e quais são as referências teóricas?
GC – Cada pessoa tem uma formação diferente da outra. Não existe uma escola específica. Então, tem gente que vem da arquitetura; atores de Teatro que resolvem fazer figurino, acabam fazendo cenário e depois viram diretores de arte. As únicas escolas que têm cenografia são para teatro. Também tem bastante artista plástico que vira diretor de arte de cinema. Além disso, algumas pessoas conseguem estudar fora do Brasil.
RC – Geralmente, qual a estrutura e o tamanho da equipe que é subordinada à direção de arte?
GC – Em geral, tem o diretor de arte e um assistente; se o projeto tiver muita construção, também tem um cenógrafo; um produtor de arte; um produtor de objetos; e o contra-regras, que é super importante nos filmes. Cada produtor tem um assistente, sempre tem vários estagiários. Nos Estados Unidos, tem o que eles chamam de “production designer”, que é o cara que cria o conceito visual do filme, e o diretor de arte executa esse conceito.
RC – Que tipo de diálogo você estabelece com o diretor de fotografia para que essa parceria, que é tão fundamental no cinema, seja harmoniosa?
GC – Preciso saber o que o fotógrafo quer de mim, e o que quero dele também. Então, sempre conversamos sobre os pontos de luz que vão ter nos cenários; por onde entrará a luz (se vai ser por cima, pela lateral etc.). A cor da parede, por exemplo, é super importante para o fotógrafo. Dependendo do que ele quiser , não posso usar branco. Aliás, eles odeiam o branco... é muito balancear as outras cores com branco. Então, o diretor de arte precisa entender como vai ser a fotografia, para fazermos o projeto em conjunto.