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QUEIME DEPOIS DE LER

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Um cineasta quando realiza um trabalho e ganha reconhecimento do público, inclusive de crítica, é natural que seus próximos trabalhos sofram uma pressão natural que, a cada trabalho haja superação sobre outro. É natural também quando alguns cineastas ainda sobre essa pressão não conseguem se superar e muitas das vezes se destruir. Nesse meio, entre um mundo completamente renovador e pessoas que buscam novas referências, a reinvenção sempre será necessária.
Depois do denso e premiado “Onde os fracos não têm vez” os irmãos Coen estrategicamente voltam e criam mais uma vez o estupidamente divertido “Queime depois de ler”. Nada poderia ser melhor para atender as expectativas dos fãs da dupla, do que criar mais um filme que tira sarro das ignorantes atitudes da sociedade e a que isso é capaz de levar.
“Queime depois de ler” vem com uma narrativa que faz do “ridículo” sua premissa, é assinado pelos irmãos Coen e conta uma história sobre coisas inacreditáveis, imbecilidades, idiotices entre outros fatos que fazem os personagens da trama a tomarem atitudes ilógicas que ocasionam a reações completamente mais estúpidas.
A obra conta a história de um funcionário da CIA que está escrevendo o livro de sua vida, mas perde o CD que guarda o conteúdo. Dois funcionários de uma academia encontram o objeto e tentam se aproveitar da descoberta. Com uma trama um pouco barata os irmãos Coen ainda procuram satirizar com técnicas visuais dos filmes de espionagem e ridicularizam o estilo com as atitudes como os dois funcionários da academia, Chad (Brad Pitt) e Linda (Frances McDormand) quando encontram o CD do ex-agente da CIA com documentos que julgam valiosos para a Segurança Nacional e não conseguem pensar nada melhor do que vender aos russos (!).
Destaque para a atuação de Brad Pitt. Com um cabelo cheio de luzes e “tipão” metrosexual machão, o ator consegue convencer como Chad, um indivíduo que encara o mundo ao seu redor de forma vazia e estúpida. O esquizofrênico George Clooney abafado por Brad Pitt tira algumas risadas, assim como Frances McDormand. Destaque também para o sempre incrível John Malkovich e J.K Simmons que em suas pequenas aparições dão grande credibilidade ao ridículo proposto.
“Queime depois de ler” pode ter soado um pouco banal e estúpido como está escrito nas linhas acima, mas no seu caráter de representação e de seu próprio humor negro (característica sempre marcante dos Coen), é válido de repente pelo grito daquilo que estamos nos tornando, seja pelas coisas impensáveis da vida, seja pelo simples fato de que é bom ser idiota de vez em quando, mas sempre com um pouco de esperteza... porque o humor negro do cotidiano ainda poderá lhe custar a vida.

SOBRE O QUE ESTÁ ROLANDO

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Hoje vamos escrever um pouco sobre as produções que serão realizadas nos próximos anos, assim você perceberá que grande obras, ótimas refilmagens, continuações e filmes com propostas novas ao tema embarcam no meio cinematográfico.
A saga “Jogos Mortais” teve seu quinto filme recém lançado no cinema e já promete o sexto episódio da série. “Jogos Mortais 6” terá um novo diretor, o montador Kevin Greutert, segundo informações do site shocktillyoudrop.com. O site ainda revela que a atriz do sexto filme será escolhida através de um reality show intitulado Scream Queens, onde 10 atriz aspirantes ao filme encaram cobras, centenas de baratas e nadam em uma piscina de sangue. A produção ainda não tem data confirmada.
O diretor do último “A Fantástica Fábrica de Chocolates”, Tim Burton vai dar sua versão de “Alice no País das Maravilhas”. Segundo um dos atores do filme, Alan Rickman (A Lagarta da obra) informou ao site MoviesOnline que o filme é uma mistura de live-action, animação e stop motion. O ator Johnny Deep também estará no filme como “O chapeleiro Maluco”. Uma atriz australiana será a protagonista da versão de Tim Burton, a pouco conhecida Mia Wasikowska.
E no primeiro semestre de 2009, o mutante mais famoso da série X-men, Wolverine, terá seu próprio filme. Com direção de Gavin Hood o filme vai tratar do personagem-título antes de se juntar aos X-men. Wolverine ainda traz um dos integrantes do grupo Black Eyed Peas, o cantor e rapper Will.i.am no papel de John Wraight e Hugh Jackman ainda interpreta Wolverine.
O filme Crepúsculo já tem sua continuação com estréia. Em novembro de 2009, Lua Nova terá sua continuação com o diretor Chris Weitz da adaptação.
Em abril de 2009, Velozes e Furiosos 4 vem com toda sua ação e velocidade juntamente com os atores das primeiras franquias, Vin Diesel, Paul Walker e Michelle Rodriguez.
Depois da continuação de Sexta-feira 13 parte 11, o aterrorizante A Hora do Pesadelo 8 vai ser produzido também sem a direção de Wes Craven e o ator Robert Englund como Freddy Krueger. O filme quer voltar sem piadas, mas puro terror.
2009 promete puro entretenimento nas salas de cinema, muitas produções ainda prometem e conforme as novidades aparecem você vai poder conferir nessa coluna. Enquanto isso um Feliz Natal e um Ano Novo cheio de paz e muito cinema!

[REC]

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Quando descubro que um filme terá uma estratégia narrativa realizada como foi feito os incríveis “A Bruxa de Blair” ou “O olho que tudo vê” e até mesmo o fantástico “Cloverfield”, grande parte do filme já ganhou da minha parte grande empatia, mesmo porque todas essas histórias vêm com enredos totalmente ficcionais e se adéquam com perfeição à realidade. Seus estilos documentais e cenas construídas com o objetivo de serem “reais” assustam e conseguem tirar muitos calafrios do espectador.
E agora foi a vez do terror espanhol [REC] realizar o grande feito criado por “A Bruxa de Blair”. Ótima película que impressiona pelo seu ritmo, ótimas atuações, intenso, com uma edição de som bem realizada e completamente assustador.
O filme começa sem frescura, e apresenta a repórter Ângela (Manuela Velasco) realizando um programa chamado “Enquanto você dorme” que, em um corpo de bombeiros, realiza uma matéria sobre o cotidiano daqueles profissionais. Ansiosa que algo interessante aconteça, a jornalista se anima quando o alarme soa no local, e dali juntamente com seu cinegrafista, os bombeiros e policiais vão parar numa situação totalmente pavorosa.
Dirigido por Jaume Balagueró e Paco Plaza, [REC] acontece sempre pelo olhar do cinegrafista (que nunca aparece) da jornalista, e com essa abordagem visual [REC] coloca o espectador como mais um integrante daquela história, tornando-a assim mais assustadora. Escrito pelos diretores e também por Luis Berdejo, o roteiro abusa do realismo para desenvolver a narrativa e, para isso, não usa nenhuma trilha sonora, descarta o uso de cortes especiais, apenas sons naturais de tudo que rodeia os personagens. O som em [REC] é tratado de maneira específica para parecer que tudo é captado pelo microfone da câmera do cinegrafista. A fotografia também possui papel importante. Realizado por Pablo Rosso, utiliza o foco de luz da câmera a manter os pontos mais assustadores do filme, a fim de revelar a expressão de horror dos personagens. É incrível a utlização do sistema “night shot”(visão noturna) que revela um dos pontos mais assustadores da trama.
Não dá para não falar do elenco de [REC], Balagueró e Plaza, conseguem de forma incrível revelar os personagens de forma muito criativa e com ótimas atuações, destaque na cena do morador César (Carlos Lasarte) que penteia os cabelos sem saber que está sendo gravado, flerta com o cinegrafista e se preocupa com a oleosidade de sua pele. Destaque também para a enérgica e intensa jornalista que busca defender com todas as forças sua matéria, independente do grau do risco em que se encontra.
[REC], por mais que utilize recursos já clichês nesse estilo narrativo, se sobressai por suas características peculiares, e mesmo que re-invente uma história a la George Romero (A volta dos mortos vivos) consegue assustar e encantar o espectador porque faz pensar na realidade da situação, que aquelas pessoas, são reais e os monstros também. É mais um grito em forma de desespero dos indivíduos que pelo medo se transformam defensores da sobrevivência, ou monstros cheios de fúria e fome.

RINGU

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Uma misteriosa fita de vídeo que, ao ser assistida, lança uma terrível maldição em seus espectadores, que morrem exatamente sete dias depois. Esta é a idéia principal de Ringu, filme do diretor Hideo Nakata que jamais esperou o que significaria sua obra para o cinema japonês no gênero terror.
Nakata criou um filme nada ousado, mas muito efetivo, tanto é que cinco anos mais tarde foi testemunha de ver sua obra sendo refilmada (O Chamado I e II) nos Estados Unidos pelo diretor de A Mexicana e o Ratinho Encrenqueiro, Gore Verbinski. Mas com uma idéia tão batida, quem sabe as vezes até “hollywoodiana”, como Ringu teve grande sucesso no Japão e contribuiu tanto para o cinema japonês? Aqui entra a questão não o que se escreve, mas como se escreve. A idéia de Ringu pode até ser clichê, mas a maneira que Hideo Nakata constrói a narrativa, é que soa original.
Uma interessante história sobre uma fita de vídeo que, ao ser assistida, lançava uma terrível maldição em seus espectadores, que morriam exatamente sete dias depois. É então que uma jornalista resolve investigar o caso e, sem acreditar muito na lenda, acaba assistindo ao vídeo – somente para descobrir, logo em seguida, que a tal praga é real. Desesperada, ela pede a ajuda do ex-marido para que, juntos, consigam descobrir uma forma de cancelar a maldição antes que esta provoque sua morte.
O filme de terror atmosférico de Hideo Nakata não desilude de forma alguma. É uma história de terror contada sutilmente, sem estilizações, mas com uma eficácia narrativa e visual absolutamente desarmante. A trilha sonora é construída adequadamente ao estilo atmosférico do filme, um cruzamento de pessoas gemendo, com barulhos e chiadeiras de metais e água escorrendo, muito bem trabalhada. A sua atmosférica opressiva, lenta e cuidadosamente criada pelo diretor, minuciosamente, suga o espectador, deixando-o sem ações durante a trama toda do filme.
A metalinguagem utilizada por Nakata na narrativa, a maneira de agregar à sua história uma certa impiedade bem realista em relação a idéia do filme, a medida que o filme lança lentamente ao espectador a razão da maldição existente na fita, das origens, casualidades. O diretor não se preocupa apenas em mostrar esses mistérios, mas os mistérios existentes na relação entre os personagens. A jornalista por exemplo, acaba criando uma relação um tanto fria com a maioria dos personagens que aparecem ao decorrer da trama. Hideo Nakata trabalha tão bem e com tanta sutileza esse relacionamento que no filme, representado pelos figurantes, as pessoas que andam pela cidade, no mundo moderno do Japão, estão sempre correndo, estressadas, esbarrando uma nas outras, sem a tradição que os ocidentais estão acostumados a se deparar, mesmo na cena em que a jornalista vai para a casa do pai de Sadako (a garotinha que sai do poço) a casa no estilo oriental, que perde sua tradição para o mundo moderno. As personagens que aparecem não criam quase algum laço emocional e Nakata faz questão de ser frio nesse aspecto, deixando a entender para o espectador que tudo e todo acontecimento misterioso está relacionado à maldição da fita.
Ringu passa na tela de uma forma tão misteriosa que não conseguimos igualar a um filme hollywoodiano que escancara o terror na cara dos espectadores, razão que Nakata mostra ao mundo que o maior terror e o maior medo é feito de sutilezas. Ringu não é um filme para a massa, mesmo por que a massa não se diverte com sutilezas. E também não deixa de ser um filme de horror, pela proximidade de que Nakata cria com seus personagens, a vertente de filmar um envolvimento que passa na mente de seus personagens, que chega ao fim de alguma forma trágica, e bastante esperançosa. A maldição pode ser fatal, mas o ser humano é mais forte e inteligente que isto.
Ringu sobretudo se tornou emblemático, ao ponto de se tornar um marco no cinema de gênero terror, responsável por criar um novo estilo, suscitando uma nova formada de filmes de horror asiático. O intento de Hideo Nakata é fugir das regras do cinema ocidental, com o objetivo de entreter o espectador, não preocupado com momentos de suspense e terror, mas preocupado em envolver-se com a angústia junto aos personagens que procuram a solução para tal maldição. Nakata foge do tradicional, a construção do horror se resume a momentos de espera para um assassinato ou morte, seguido por uma trilha sinistra, que serve apenas para um pulo na poltrona. A função de Ringu é criar tal atmosfera para capturar e torturar o espectador durante o filme todo.
O cinema ocidental finalmente despertou para olhar outras vertentes, até mesmo os próprios espectadores, causalidade de um tempo que se esgotou dos clichês e das mesmices. Os gêneros cinematográficos tornaram-se cansativos, os espectadores alienados por um cinema cheio de regras. O cinema asiático tem lutado muito contra essas regras, dando margem para a verdadeira expressão e criação da arte. Pena a força maior ainda estar com a grande potência ocidental, mas o começo já é uma maravilha. O cinema mundial atual foi jogado para o fundo de um poço sem luz, massacrado pelos clichês que copiam a mesma fórmula de se fazer cinema, mas sempre há aqueles que fazem cinema, diferenciando a melhor forma de se expressar, saindo vagarosamente do fundo, e lentamente, da tela de cinema ou da própria televisão “atacar” os mais profundos sentimentos do espectador, representando sempre bem a melhor forma da criação.

OS EXCÊNTRICOS TENENBAUMS

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O gênero comédia sempre foi um pouco criticado por certas pessoas e adorado por outras. Sempre dividiu muita gente. Só que nos tempos de hoje, esse gênero tem agregado muito ao simples fato de rir e se tornado um gênero com muitos gêneros. É a comédia romântica, a “pastelão”, terror, dramática, ação, trágica, de guetos ou rappers, etc.
Agora, quando assisti Os Excêntricos Tenenbaums, descobri um gênero de comédia mais séria, um pouco mais depressiva e melancólica, pode-se dizer que chega a ser um pouco dramática. Você pode até perguntar. É possível? Sim. Depois de Os Excêntricos Tenenbaums o famoso estilo “rir da desgraça e dos problemas das pessoas” tem enchido muitas salas de cinema.
Produção realizada em 2001, Os Excêntricos Tenenbaums é um filme que mostra todos os personagens como pessoas com graves problemas de relacionamento e muitos deles vivendo constantemente deprimidos, e por incrível que pareça, há graça nisso. Certo que há momentos em que o espectador fica na dúvida se é pra rir ou chorar, mas o charme está aí.
O filme conta a história de Royal Tenenbaum (Gene Hackman), pai de uma família que carrega um sério problema de relacionamento. Royal após ficar afastado durante anos da família, procura voltar para perto da família e reconquistar os três filhos e a ex-esposa (Angelica Huston), que está para casar com o contador (Danny Glover) que acompanha a família há tempos. Royal então começa a inventar várias mentiras como forma de aproximar-se da família, aí começa o problema. Os três filhos de Royal agora se preocupam com os próprios problemas.
Margot (Gwyneth Paltrow), filha adotiva da família, tornou-se uma mulher depressiva e guarda vários segredos dos parentes e inclusive do seu marido. Richie (Luke Wilson) alimenta um amor secreto por sua irmã adotiva Margot. Chas (Ben Stiller) vira um homem obcecado pela segurança de seus dois filhos, após perder a esposa.
Dirigido por Wes Anderson que também assina o roteiro junto com Owen Wilson (irmão de Luke Wilson), Os Excêntricos Tenenbaums demonstra um certo cuidado ao desenvolver os personagens da trama desde o início do filme, porque já nos créditos iniciais o perfil de cada um é contado como a história de um livro ilustrado. Interessante, porque percebe-se que cada personagem já publicou alguma obra e isso mostra que cada um possui opiniões próprias e lidam como visão de mundo, o que reflete e dificulta mais ainda o relacionamento entre eles.
Não dá para não notar a atuação incrível dos atores. Wes Anderson abusa de planos e tomadas que realçam a expressão de cada personagem, é incrível os planos em que Anderson encara os atores nos olhos, mostrando que cada personagem não tem medo, não se preocupa e se orgulha com o julgamento do espectador.
Vale a pena notar Os Excêntricos Tenenbaums, por um novo gênero de comédia e pela discussão de sentimentos que o filme revela, a confusão de sentimentos que a história revela, ilumina o simpático mau caráter e esconde a beleza do puro sentimento, é divertido julgar essa confusão, afinal pode-se tornar como exercício para vida ou até mesmo uma maneira divertida de rir-se e descobrir que existe uma forma diferente de achar graça dos problemas e que a vida não vai cair por isso.

HANCOCK

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Chegou nas locadoras este mês, o divertido Hancock. Um super-herói solitário, depressivo, amargurado e alcoólatra, tudo originário dos constantes prejuízos causados aos moradores e a própria cidade que supostamente protege. Este é um argumento diferente e interessante ao se tratar de um filme de super-heróis, inclusive sobre qualquer gênero de narrativa. O filme diverte, mas o diretor Peter Berg realmente decepciona por não conseguir conduzir a história de Hancock na inter-relação entre os gêneros, ou seja não rende um interessante enredo trágico-cômico. Torna-se um filme que não acrescenta muita coisa, apenas o puro entretenimento.
Assinado também por Vince Gilligan (conhecido por escrever a famosa série Arquivo X) e por Vincent Ngo, trazem Will Smith como Hancock, o cômico herói que perambula como mendigo, lutando diariamente com o fardo que carrega por ser o único de sua espécie. Hancock já desistiu de buscar a compreender de onde veio e de alguma forma tentar agradar quem quer que seja. Cansado da responsabilidade de ter que “salvar o dia da cidade” ele se entrega a tarefa de herói com descaso, o que gera um desastre ainda maior a cidade. No meio dessa confusão toda, surge o caráter e talentoso Will Smith (Hancock) que consegue construir um personagem completamente expressivo, desde o sujeito derrotado, mal humorado e melancólico ao herói que busca receber o carinho da população numa expressão gélida, mas que permite ao espectador sentir um traço de emoção por baixo da couraça de depressão que carrega aquele personagem.
É cômico quando entra em cena o relações-públicas Ray Embrey (Jason Bateman) que resolve adotar Hancock e torná-lo um super herói digno de ser amado. É uma pena ver um ator com grande talento como Bateman fazer um papel do puro sentimento e bonzinho homem de família, não exigindo suas qualidades como ator. É triste também ver a maravilhosa Charlize Theron em um papel que apenas exige olhares preocupados em um close, sua beleza esta incrível em Hancock, mas o próprio papel de dona de casa desesperada não permite utilizar seus poderes como atriz.
Como já foi dito, é uma pena que Hancock poderia funcionar como filme consistente, mas Peter Berg não consegue, imaginar o quão dolorosa seria a história de Hancock, e a felicidade de encontrar alguém que pudesse reconstruir e reescrever sua vida. Descobrir que Hancock é um super herói onde a sociedade é sua força e a fraqueza ao mesmo tempo (é diferente com a gente?), isso são fatos que se bem desenvolvidos e bem escritos não tornariam Hancock apenas um filme divertido, mas sim uma maneira bastante criativa de rir e chorar de si mesmo e da própria sociedade.

MIGRAÇÃO ALADA

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Indicado ao Oscar de Melhor Documentário em 2003, Migração Alada teve a sua indicação metralhada pelo diretor Michael Moore por Tiros em Columbine e a poesia visual do diretor francês Jacques Perrin acabou migrando para alguns cinemas e logo as prateleiras de documentário das locadoras. O intento do filme não se resume apenas a isso, se resume nos diversos vôos e migrações que o filme realiza através do gênero documentário.
Jacques Perrin não assina a direção sozinho. Jacques Cluzaud, Michael Debats, Francês Roux e Guy Jarry também testemunham uma grande variedade de pássaros durante sua migração que atravessam 40 países e 7 continentes. Para estabelecer as inserções dessa migração, através de balões, planadores, helicópteros e aviões, uma equipe de 450 pessoas, 17 pilotos e 14 câmeras voam em frente, ao lado, abaixo, acima e atrás dos pássaros, a fim de construir um maravilhoso documentário visual.
Por mais que Migração Alada levante o questionamento da imagem-real e da imagem-ficção ao espectador, logo na abertura o filme trata de informar que as imagens foram captadas sem efeitos especiais, o argumento não serve como resposta, mas o próprio documentário convence o espectador de que a natureza precisa ser documentada de forma representar não como ela é, mas o que é. O efeito de deslumbramento constante é o que busca o filme, sem perder sua narrativa direta, o documentário revela o mundo natural para o olhar do espectador, mostrando a beleza que o próprio homem-espectador desconhece, razão essa que Migração Alada inicia o filme com a interação de uma criança com os pássaros, o lidar da inocência com um mundo novo e deslumbrante, um espectador que se maravilha com a primeira luz, as primeiras descobertas e as primeiras lições.
A ausência do narrador onipresente (técnica comum utilizada em documentários) faz com que o próprio espectador se interesse pela narrativa escolhida e interaja com maior força com o filme. O próprio Perrin e seus co-diretores não queriam deixar uma hora e meia de pássaros voando na tela, por isso o argumento da migração para criar uma dramatização no documentário que começa num ponto de partida: o deslocamento dos pássaros para o Norte na estação da Primavera e a promessa da volta, a migração na estação do Outono. A narrativa se torna um círculo, e a linguagem se torna claramente dramática, caso que é representado no início quando a criança retira das redes um pássaro preso, e esse ao levantar vôo, leva consigo um pedaço da rede presa à pata e é reconhecido em outros momentos do filme por estar trazendo de volta o mesmo resquício da rede.
A própria necessidade de tornar humano a relação e a vivência dos animais é um “golpe” aplicado para gerar a atenção do público e o filme acaba ganhando um interesse maior durante a narrativa, a necessidade do cinema documentário se tornar transparente, como o próprio estilo hollywoodiano. Cenas como o plano de uma arara azul que consegue libertar-se da gaiola, motivo por qual o espectador “torce” pela liberdade da ave; o macaco que “tristemente” desiste de lutar e com uma expressão “humana” demonstra seu fracasso. Tem-se também o pássaro com a asa quebrada que cercado por siris torna-se vítima indefesa, motivos que leva a ignorante inocência-espectador refletir e a se deslumbrar.
Migração Alada é um ótimo filme-documentário como forma de conhecimento e entretenimento, poucos ainda conseguem se reinventar de forma tão real ou tal como é. Muitos documentários ganham seus prêmios a fim de mostrar algo na história que já possui sua dramaticidade, difícil é criar um documentário que demonstre da natureza seu próprio drama e sua própria beleza.

ENSAIO SOBRE A CEGUEIRA

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Em um dia qualquer, em tal hora, em tal lugar, um homem no movimento de uma cidade grande aguarda o semáforo mudar para a cor verde, mas tal mudança não acontece, ele ficou cego.
Assim começa o magnífico livro “Ensaio sobre a cegueira” de José Saramago mais uma obra que seduz o cineasta Fernando Meirelles, que, sempre gostou de fazer adaptações literárias, grande diretor marcado por narrativas político-sociais que permeiam seu cinema, do divertido e engraçado “Domésticas”, o chocante e impactante “Cidade de Deus” e o primeiro “oscarizável” de suas obras, o fabuloso “O Jardineiro Fiel”. Assinado também por Don McKellar , a adaptação “Ensaio sobre a cegueira” busca representar mais uma discussão sobre o rumo de uma sociedade moderna e globalizada e o rumo que esta vem tomando. Este combate utópico mergulha em um mundo completamente atemporal e caótico, as placas dos carros são brasileiras, pessoas falam em inglês, o locutor de rádio em português. O espectador se depara com imagens de São Paulo, outras do Japão e até do Canadá, representados nesse novo mundo globalizado e pequeno, onde todos se conhecem e ao mesmo tempo distanciam-se da própria condição humana e aproximam-se do instinto básico animal.
“Ensaio sobre a cegueira” procura discutir o fato de que as pessoas antes de perderem a visão, já viviam completamente “cegas” perante o mundo em que vivem. Onde a cura para a tal “cegueira branca” só estaria na re- socialização da humanidade, no ato de reconhecer que dependemos dos outros e necessitamos enxergar o próximo. Para isso, é interessante a lógica que a narrativa busca retratar, assim como no livro, as pessoas não tem nome e são identificados apenas pelas profissões ou características mais marcantes, exemplos como “O médico”, “A mulher do médico” “O garoto estrábico”. E não é assim que definimos no nosso mundo as pessoas que nos cercam? As vezes de forma injusta e até pejorativa?
Meirelles conduz sua obra de forma inteligente, junto com seu elenco busca desenvolver com maestria os personagens criados por Saramago. Por exemplo a maravilhosa Juliane Moore, representa “A mulher do médico”, dona-de-casa entediada, com grande atuação Moore representa tal marasmo, com apenas um olhar distante e um simples gole de vinho, e ao longo da história “A mulher do médico” vai se tornando uma personagem mais complexa, ainda mais que ela vira peça fundamental não só da vida de seu marido como a de um grupo de pessoas. Assim como, Gael Garcia Bernal, “o Rei da Camarata 3” consegue se tornar asqueroso e cômico ao mesmo tempo, destaque para o momento em que imita o cantor Stevie Wonder.
O visual do filme também merece destaque. A direção de fotografia de César Charlone, investe numa câmera totalmente oscilante, planos que cortam os personagens e cenários pela metade. O ar de brancura e frieza existente em toda projeção colocando ou aproximando o espectador a própria “cegueira branca”.
“Ensaio sobre a cegueira” tem em todo seu aspecto fatores representativos, cenas que chocam e ao mesmo tempo nos comove pelo simples fato de estarmos inseridos no mesmo contexto do filme. Se estamos irritados pelo fato de que alguém atrapalha o seu filme por conversar, ou até mesmo alguém que passeia pelo cinema. De repente um estado de “cegueira branca” é necessária, se estamos em um mundo que nos coloca dependentes de qualquer um, não é cor, sexo, opção sexual ou condição social que nos afasta, é simplesmente a ignorância de um pano branco que paira sobre os olhos de uma sociedade que não quer ver que tolerância e amor é o melhor meio de seguirmos em frente, sempre juntos.

AMARELO CINEMA QUE PULSA

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Amarelo Manga, produção brasileira de 2003, do pernambucano Cláudio de Assis, particularmente, tem sido um dos filmes mais arrebatadores, chocantes e realistas já inventado ou produzido no cinema brasileiro. Difícil, é ver, e até mesmo falar de Amarelo Manga, ora por não querermos enfrentar a situação real da condição humana, ora por não aceitar que vivemos nesta real situação, na sociedade conturbada, doentia, mesquinha, dilacerada, pobre e contraditória como a do Brasil. Adjetivos que resumem a ideologia da desconcertante e incômoda obra de Cláudio de Assis.
Com um tributo à cidade de Recife, Amarelo Manga, explicita a situação da condição humana, através de histórias que se entrelaçam de forma inteligente e dinâmica fazendo o espectador se remoer e rever suas crenças, valores e opiniões que surgem durante a narrativa, através das atitudes das pessoas, nessa multifacetada discussão social.
Lígia (Leona Cavalli), mora e trabalha em um bar chamado Avenida, sua vida cotidiana se resume em acordar e já ir direto ao trabalho, todos os dias são iguais, até mesmo as reclamações. Sua relação com o próprio corpo não possui restrições, está sempre a mostra, celebra o corpo, mas o interdita a posse e não aceita as provocações feita por seus clientes do bar.
Isaac (Jonas Bloch) é um dinamarquês-brasileiro envolvido com o tráfico de drogas e está sempre a busca e negociando cadáveres para satisfazer um próprio fetiche, atirar em corpos em decomposição.
Kika (Dira Paes), uma evangélica que está sempre escondendo seu corpo e preocupada com comentários do próximo, acaba servindo de “chacota” para sua vizinhança, justamente por ser casada com um mulherengo que trabalha em um matadouro.
Wellington “O Kanibal” (Chico Diaz) é o marido mulherengo de Kika que trabalha no matadouro, possui uma amante para satisfazer seus desejos sexuais, relação que não possui com Kika.
Trabalhando e morando em um hotel, Dunga (Matheus Nachtergaele), é um homossexual, que deseja tanto no amor, quanto no sexo, o Kanibal. É capaz de fazer qualquer coisa para possuir mulherengo.
Esteticamente, o filme se apodera de uma linguagem visual que representa a relação social dos indivíduos criados a partir das possibilidades do mundo real. Amarelo Manga nos questiona se fazemos parte do mundo proposto, vivendo cada momento, mesmo que muito repugnante. Traição, religião, discussão de gênero, tudo se escancara frente à tela, como um tapa de mão cheia no rosto do espectador. Mesmo porque, o mais forte da obra está representado numa linguagem carnal, animal, sanguíneo seja qual for o sentido das suas significações. Personagens se inserem num círculo, numa dimensão, num cenário de desejo, que os tornam determinados a lutarem seja de qual forma for por sua ambição. Individualismo combativo marcado justamente pelo desejo, desejo da carne, do sangue, que serve de guia para a determinação. Personagens guiados pela paixão, que penetram, num plano de armadilhas e vinganças, de uma busca avassaladora pelo desejo e pela felicidade.
Amarelo Manga sempre se representa numa relação primitiva e individualista de cada personagem, através de uma filosofia trágica onde o homem transita como um animal degenerado que vaga sobre o pasto em direção a seu matadouro, com sua marca de sangue que o impede à felicidade e seu principal objetivo, o desejo.
O próprio diretor Cláudio Assis afirma: "quero fazer um cinema que mostre o povo, o seu lado mais marginal, o submundo. Não quero fazer filmes limpinhos nem filmar o sertão com gente bem vestida. O nosso povo não é assim".
Felizmente Amarelo Manga vem propondo ao cinema nacional, a característica da ideologia, a realidade e sua própria estética. Assim, os indivíduos são capazes de aprender, e até mesmo de entender e a aceitar a cultura, os costumes, as crenças,e que, a maldade, a contradição e a própria condição humana pode estar presente na vida de qualquer outro indivíduo que faça parte do universo.
Amarelo Manga, como foi dito é um filme difícil de se falar e de entender ou seja, de aceitar a própria realidade, que realmente vivemos na própria órbita de um amarelo manga, vivo e pulsante, quem sabe da cor do ouro, cor que reluzirá apenas no momento em que curarmos o amarelo das feridas purulentas, doentio e sarcástico.

BEM VINDO A CIDADE DOS CACHORROS

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Provando que é um diretor talentoso e criativo, ou quem sabe muito mais do que isso, Lars von Trier, depois de Dançando no Escuro realiza o brilhante e o fascinante de Dogville, no qual utiliza um recurso que não se afasta muito das limitações que havia determinado com o Dogma 95, apenas o uso de luz ambiente, a proibição do emprego de trilha sonora, entre outros oito pontos de proibições para técnica cinematográfica. E com Dogville, Lars von Trier resolveu ousar mais ainda e baniu quase todos os cenários do filme, caracterizando e representando a cidade de Dogville a uma série de traços no chão e poucos objetos de cena.
Situada durante a Grande Depressão Americana dos anos 30, a história gira em torno de Grace (Nicole Kidman), uma jovem que, depois de fugir de perigosos mafiosos, vai parar na minúscula Dogville, que possui pouco mais de uma dezena de residentes. Encantado com a moça, o introspectivo Tom (Paul Bettany) propõe que a cidade ofereça abrigo a Grace, que, em troca, faria pequenos serviços para seus moradores. Aos poucos, porém, os aparentemente pacatos habitantes de Dogville vão exibindo um lado sombrio e passam a explorar a garota, que, impedida de abandonar o lugar, se descobre em uma prisão capaz de lhe causar mais sofrimentos do que os próprios gângsters.
Dogville estranha pela imposição dos cenários atípicos. Sua ausência cria um novo estilo de se ver cinema, um cinema mais teatral de Lars von Trier, surgindo um novo recurso simplesmente genial, que afasta a própria cidade, os personagens e o espectador para um local isolado de tudo e realça o sentimento de isolamento, que bloqueia qualquer intervenção externa. Dogville assume uma vontade própria, que se recria na mente de cada espectador, Lars von Trier dá essa liberdade e anula sua influência sobre o filme.
Os segredos na cidade pequena de Dogville são impossíveis de ser guardados, porque todos os personagens estão sujeitos e vulneráveis pela maldade sutil existente em cada um. O objetivo principal do diretor é focalizar a total exposição dos personagens e com grande criatividade Lars von Trier não permite que vejamos o lado sombrio dos moradores daquela cidade e surpreende a audiência quando se deparam com as crueldades realizadas com Grace, identificando ao espectador de que até o ser humano mais inofensivo pode ter atitudes contraditórias e ameaçadoras.
A protagonista, Grace, é um exemplo completamente contraditório dos moradores da cidade, ingênua, acredita sempre na bondade das pessoas e se essas possuem atitudes sombrias, é justamente por causa do medo existente em cada um. O espectador pode até pensar que a atitude de Grace no final do filme é devido aos maltratos de Dogville, mas Grace não conter sua própria crueldade, não é fruto dos abusos, mas sim do desgosto de ver sua bondade e seu otimismo destruído por suas experiências. A irônica conclusão do filme é impiedosa, revela muito, mas não apenas sobre Grace e os moradores de Dogville, mas principalmente sobre o espectador e seu sentimento ao desfecho da obra.
Lars von Trier realmente nos mostra que somos seres contraditórios, hedonistas e insatisfeitos, as vezes pelo próprio medo, buscamos a melhor e a pior forma de satisfazer nossos desejos, independente de quem ou com quem que da mesma forma busca o incessante egoísmo do prazer. Somos o pior e o melhor ser humano existente no mundo. Para o mundo, somos o pior.

SEMPRE... AS HORAS.

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“Encarar a vida pela frente... Sempre. Encarar a vida pela frente, e vê-la como ela é. Por fim entendê-la e amá-la pelo que ela é. E depois deixá-la seguir... Sempre os anos entre nós, sempre os anos... Sempre o amor. Sempre a razão. Sempre o tempo... Sempre... As horas.” Virginia Woolf.

Em 2002, o diretor Stephen Daldry realizou o denso e notável filme “As Horas”. Adaptação do premiado livro de Michael Cunningham, “As Horas” nos revela o retrato sofrido de três mulheres em diferentes épocas que, apesar de estarem em gerações diferentes, possuem características comuns em suas visões de mundo, assim como uma curiosa ligação com um livro: o romance “Sra. Dolloway” da escritora inglesa Virginia Woolf. O roteiro desta produção é assinado com grande sensibilidade por David Hare que inicia o enredo com Virginia Woolf (Nicole Kidman) em 1923, escrevendo sua obra literária “Sra. Dolloway”, enquanto tenta se acostumar na pequena cidade em que seu marido a obrigara morar para tratar dos graves problemas psicológicos durante o período em que residia em Londres. Paralelamente, em 1951 Laura Brown (Juliane Moore), perfeita mulher de família, lê a obra escrita por Virginia enquanto tenta lidar com o sofrimento da infelicidade de viver com seu filho de 5 anos e o marido. E em 2001 nos deparamos com a versão moderna da personagem de Woolf, Clarissa Vaughan (Meryl Streep) que prepara uma festa ao amigo Richard (Ed Harris) que, HIV positivo, está sendo homenageado pelo sucesso de seu livro.
Três mulheres que escondem o sofrimento e a dor de enfrentar um dia, o motivo, o roteiro procura não explicar ao espectador, mas não tem necessidade. “As Horas” se concentra na maneira que estas mulheres lidam com os sentimentos, sem compreender exatamente o que as aflige. Virginia é uma mulher contraditória que, luta e defende suas atitudes, mas ao mesmo tempo teme ser julgada pelos criados da casa.
Clarissa Vaughan é uma mulher inteligente que demonstra força e independência, mas revela-se uma mulher vulnerável, questiona sua própria vida pelo fato de estar vivendo com sua parceira e ao mesmo tempo doar-se ao amigo doente que procura demonstrar a Clarissa a necessária forma de não viver pelos outros.
Por outro lado, numa época dominada pela obsessão da “família perfeita americana”, Laura Brown precisa lidar com sua depressão para assumir o papel de mulher e dona de casa perfeita. Uma mulher que tem seus sonhos sufocados pela vida de aparências que assumiu, culpada pela ingratidão à família, demonstra seu carinho através de atitudes totalmente artificiais como o momento em que ela e o filho resolvem fazer um bolo para o pai para que assim amasse sua família.
Em seus aspectos técnicos “As Horas” é conduzido com maestria pela edição de Peter Boyle. Sensível e elegante é maravilhoso como as cenas das diferentes épocas se entrelaçam sem destoarem da fotografia proposta a cada geração. Também não dá para não falar da direção de fotografia de Seamus McGarvey que encanta o olhar do espectador em um anestésico e paradoxal sentimento que acalenta e adoece ao mesmo tempo, acompanhado pela bela e melancólica trilha sonora de Philip Glass.
Sensibilidade é o que define “As Horas”, seja pela atuação ou pela condução do filme. Assim como o livro, o filme cinematiza e interliga os sentimentos de mulheres que procuram encarar a vida pela frente e procuram entendê-la como ela é, independente amá-la. As horas sempre vão parecer intermináveis, mas é preciso enfrentá-las seja pelo tempo, amor ou razão.

UMA CIDADE CHEIA DE SONHOS

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Sempre gostei de analisar a expressão das pessoas no cinema depois que um filme termina. As luzes se acendem e lá estão novos indivíduos que amaram ou odiaram a projeção passada, pensando se valia ou não a pena ter gastado dinheiro e passado duas horas sentado. É melhor também quando você pega um filme que procura fugir de todo o padrão hollywoodiano e comercial, quebra a narrativa tradicional e foge dos padrões acostumados pela massa. Esses geralmente são os mais detestados pelo público.
É por isso que sempre digo às pessoas não julgarem um filme a primeiro momento, se você não entender, duvide e assista ao filme novamente, sua percepção vai mudar. Acredito que aí está o bom cinema também, que o faz pensar, interpretar e o leva a visões completamente diferentes das que você já teve. Condenar aquilo que não entende é errado, antes de julgar aprenda a olhar e maravilhe-se, porque existem muitas pessoas querendo falar da vida, e quando se foge da tradicional forma de se contar historinhas, essa arte ganha um pouco mais de graça.
Para exemplificar um pouco disso, hoje indico a vocês Cidade dos Sonhos (Mulholland Drive) de David Lynch. Vocês já devem ter ouvido falar desse diretor, se não, pelo menos já assistiram alguma obra desse maravilhoso artista. David Lynch é o consagrado criador do seriado de sucesso Twin Peaks, que contava o mistério do assassinato de Laura Palmer. Também dirigiu outras obras primas como “Coração Selvagem” (Wild Hearts), “A Estrada Perdida” (Lost Highway) e o “O Diabo Veste Azul” (Blue Velvet) entre outras.
Voltando ao filme proposto, vamos falar de “Cidade dos Sonhos”. É um filme complexo, sim, mas não incompreensível. Muitas pessoas não tem percebido a magia criada por Lynch nessa obra, mesmo porque nos dias de hoje, a maior parte das produções cinematográficas não tem exigido muito de seus expectadores, tudo soa simples e auto-explicativo, os filmes pensam por nós e tudo explode com cenas espetaculares que enchem nossos olhos, anestesiando o poder crítico dos espectadores.

Roteirizado e dirigido pelo próprio Lynch, “Cidade dos Sonhos” é uma produção extraordinária e muito bem realizada, ou quem sabe apenas o que Lynch sempre desejou: cinema puro, baseado na manipulação sutil de som, imagem e atuação. O diretor consegue, contar uma história comovente, com uma estrutura narrativa totalmente entrelaçada e criativa.
Tudo começa como uma história comum. Uma mulher misteriosa (Laura Elena Harring) que acaba sendo vítima de um atentado enquanto anda de limousine na Mulholland Drive (nome de uma estrada em Hollywood), mas um acidente com um carro em alta velocidade a salva da morte. No entanto, ela não escapa de uma amnésia, e vai parar no apartamento da tia de Betty (Naomi Watts), uma aspirante à atriz, de quem fica amiga e, depois, amante. Paralelamente, se conta a história de Adam Keshner, diretor de cinema que se envolve com a máfia italiana ao ver que seu filme não sairá como quer, devido à escolha impositiva da máfia de escalar uma modelo desconhecida chamada Camilla Rhodes. Há também a história de um homem que vê monstros atrás de lanchonetes, de um Clube chamado “Silêncio”, de uma caixinha azul e uma chave misteriosa.
Como se trata de um trabalho de David Lynch a trama de Cidade dos Sonhos ao seu decorrer se torna complexa, e a forma que o diretor a desenvolve se torna mais ainda, porque utiliza diversos tipos de narrativa, inserindo cenas sem nexo, flashbacks, sonhos, delírios e até mesmo cenas fora de sua ordem cronológica que aparecem sem avisos, o que acaba brincando com a percepção do espectador, fazendo-o buscar suas próprias referências para a compreensão, ainda mais quando o filme chega aos seus vinte minutos finais, o espectador completamente se perde e precisa re-organizar sua mente para compreender o que realmente aconteceu, a trama muda totalmente de sentido.
“Cidade dos Sonhos” é um filme que não se deve deixar de assistir, por mais complexo que ele possa soar, é um perfeito exercício de lógica. Com certeza você vai encontrar uma experiência completamente diferente daquela que existe ao assistir filmes comuns. O que se é acostumado ver, acostumado se é compreender. Lynch teve noção disso e da melhor forma nos demonstra neste filme que é necessário sair do tradicional para que possamos compreender seja em nossa realidade, ou numa cidade cheia de sonhos.

VAMOS FALAR DE CINEMA

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Quando se planeja escrever sobre algo que você tem paixão, pensa-se em organizar todo o turbilhão de idéias que isso lhe proporciona para não faltar nada e não ter que voltar atrás, buscar o esquecido e começar tudo novamente a partir de outra idéia. Também faz-se planos da melhor maneira de escrever, qual a melhor forma, qual delas oferece melhor compreensão, a mais resumida ou mais completa, afinal é sobre uma paixão que estamos falando, e esta no meu caso, é o cinema.
Começo este espaço com a pergunta “aonde quero chegar com esta paixão?” O cinema tem sido isso há muitos anos. Quando ingressei na faculdade de Publicidade e Propaganda em Foz do Iguaçu no ano 2000 me perguntei, se eu gostava tanto de cinema porque fazer uma faculdade de propaganda? Mesmo assim fiz. Ainda no início do curso tive a oportunidade de fazer uma atividade extracurricular em Direção de Cinema e lembro do cineasta Percy Tamplin dizendo: “Se você descobre que um filme é bom na primeira cena, acredite, você já é apaixonado pelo cinema.”
E ele disse isso não porque soa como regra de se descobrir bons filmes, mas sim porque ele sabia que em um mundo mágico como o cinema, independente de cenas, não precisa fazer muita coisa para te cativar.
Acreditando nisso virei cinéfilo de carteirinha e esse mundo cinematográfico representaria toda suposta realidade da minha vida e a cada cena “lavaria” o meu olhar para encontrar nos filmes suas diferentes realidades. E essa força que o cinema tem em nossas vidas passa por cima daquilo que procuramos para concordar ou contrapor nossas idéias. É como por exemplo conversar com uma pessoa conhecida, um amigo ou familiar. O cinema passa pelas veias invisíveis do cotidiano, e continua no nosso inconsciente preenchendo o reflexo e a representação que temos da realidade.
Compreender a vida sempre teve sua forma crua de realidade e o cinema veio para anestesiar todos esses sentimentos. Já somos acostumados a encher os olhos com as produções hollywoodianas e acreditar inconscientemente nos personagens destas produções, pessoas frias e esquizofrênicas. Os franceses dos anos 70, descolados, intelectuais e sexualmente liberais ou os asiáticos que gritavam em forma de poesia sua cultura, crenças e valores. Cada um tem o cinema a representação de sua realidade.
Também temos como exemplo as frases e os personagens que citamos e copiamos no nosso cotidiano, seja propositalmente ou até mesmo sem querer. Ou então, nas situações que acontecem em nossa vida e concluímos que tudo passou na nossa frente como um “filme” ou que tal situação era “cena de um cinema”. É a projeção do que somos e do que queremos ser, afinal nosso comportamento, nossa realidade precisa estar baseada em alguma coisa, ainda mais quando ela é cinematográfica.
Ao finalizar minha Pós- graduação em cinema em Curitiba descobri que todo tipo de cinema é bom, seja ele entretenimento, documental ou independente, cada um representa uma realidade de alguma forma. No meu caso aprecio mais uma obra que outra quando esta se expressa de forma diferente, fora do comum. Essa é minha realidade e, creio, de muitos amantes da sétima arte. Um filme que foge dos clichês precisa sua atenção especial, pois de comum já basta o cotidiano.
Para escrever sobre essa paixão, reúno todas as cenas, frases, personagens, realidades, não apenas a que quero representadas, mas todas. Filmes, bons ou não, que circulam no turbilhão das minhas idéias. Sendo assim, se precisar voltar ao inicio, e acredito ser necessário, buscarei o esquecido para traçar um novo caminho. Quero convidá-los a me acompanhar para compartilharmos esse turbilhão de idéias e vidas que o cinema nos proporciona. Não prometo chegarmos a uma verdade. Afinal nossa realidade muda a cada dia e como o cinema é reflexo disso tudo, entender essa dinâmica é necessário.